Pantanal e cultura: reflexões acerca do homem pantaneiro nas ações do PIBID

PEDAGOGIA – CPAQ

SILVA, A. L. G.

FERREIRA, A. S.

CASTRO, D. O. M.

JUNIOR, O. T.

Resumo: A amplitude do debate sobre a cultura regional pantaneira é contemplada por diferentes olhares, mas a figura do homem pantaneiro, como objeto de estudo ainda requer uma ótica mais aguçada. Foi pensando neste homem que, na sua simplicidade cria, recria e se reinventa todos os dias, que propomos reflexões acerca da sua representação na formação cultural da nossa região. E, justamente por estarmos envolvida diretamente nas atividades do Projeto: Cultura pantaneira no chão da escola como pibidiana do curso de Pedagogia/ CPAQ vislumbramos a possibilidade de abraçar a tarefa revisitando a vida cotidiana deste homem. O interesse incide por se tratar das lembranças (em memória) da figura de um pai que nasceu e viveu como homem pantaneiro. Para tal buscamos uma metodologia da ação/reflexão/ação respaldados pelas leituras de autores como: Sigrist, (2000), Nogueira (2002), Ribeiro (1984), entre outros. Caminhamos sob a coordenação acadêmica da Professora Dra. Ana Lúcia Gomes da Silva e dos Supervisores Professora Denair Ottoboni Maciel de Castro e Professor Orestes Toledo Junior. Podemos apontar resultados, ainda parciais, que nos convidam a continuar no exercício docente prezando pela valorização e reconhecimento da nossa história na figura do pantaneiro que foi Cândido Ferreira (1915/2007), homem simples, analfabeto das letras, mas pedagogo pelas experiências da vida. Durante seus noventa anos dedicou-se a amar e respeitar o bioma pantaneiro, ressaltando as inúmeras possibilidades de aprender com o chão onde vive, as quais muitas obras já foram escritas enriquecendo a região Centro Oeste do Mato Grosso do Sul.

 

Palavras chave: PIBID, Cultura Regional; Homem Pantaneiro.

 

Introdução

O Pantanal de Mato Grosso do Sul tem sido referência em muitos debates acadêmicos nacionais e internacionais por ser considerada parte da maior área alagável do mundo. Todavia denota-se uma maior atenção na fauna e na flora deixando de lado o homem pantaneiro, uma figura de suma importância para o bioma. A amplitude do debate sobre a cultura regional pantaneira é contemplada por diferentes olhares, mas a figura do homem pantaneiro, como objeto de estudo ainda requer uma ótica mais aguçada

A vida no pantanal obedece ao ciclo das águas advindas das chuvas que caem de outubro a abril transformando o local, em “cheias” nesse período, quando as chuvas param as águas tendem a baixar novamente. Neste cenário de grandes transformações, vive de maneira simples, o homem que aprendeu a se orientar pelas cheias e secas do pantanal, como um cientista que observa as mudanças de ano em ano. Viajando na comitiva com a tropa e a boiada para refugiar-se das cheias, contando os contos misteriosos que sobrevivem de geração a geração, convivendo com os mais diversos animais, usufruindo-se imensamente da flora que também lhe serve de farmácia natural, assim vive o homem pantaneiro.

Foi pensando neste homem que, na sua simplicidade cria, recria e se reinventa todos os dias, que propomos reflexões acerca da sua representação na formação cultural da nossa região E, justamente nosso envolvimento, por meio da CAPES pelo Programa Institucional de Bolsa com Iniciação à Docência (PIBID) no curso de Pedagogia/CPAQ nos oportunizou participar das atividades do Projeto: Cultura pantaneira no chão da escola focando na figura do homem pantaneiro. Vislumbramos aí a possibilidade de abraçar a tarefa revisitando a vida cotidiana deste homem. O interesse incide por se tratar das lembranças (em memória) da figura de um pai que nasceu e viveu como homem pantaneiro.

 

As memórias do pantaneiro (pai) que foi Cândido Ferreira

 

Apreciador e bom contador de causos, Cândido Ferreira (03/10/ 1915), nasceu no Pantanal mais precisamente na Fazenda Bahia dos Patos, município de Corumbá. Trabalhador em várias fazendas até chegar ao município de Aquidauana onde estabeleceu moradia após aposentadoria, porém jamais desligou-se de suas raízes, com frequência retornava a sua terra natal. Filho mais velho de nove irmãos, recusou-se ir para a escola para viver em meio a natureza. Matemático, astrólogo, curandeiro, geografo, pedagogo … quem o conhecia logo observava o autodidata que aprendera como bom observador do bioma pantaneiro. Conduzia a boiada, tocava berrante, domava cavalos entre várias outras habilidades que aprendera com a vida.

Dentre tantas habilidades, a de artesão ganhou destaque chegando a render sua ida para o exterior. Conservador dos costumes antigo aprendeu a partir da própria natureza o oficio de criar e assim tirar seu sustento. O couro que tiravam dos bois durante as carneadas nas fazendas viravam verdadeiras obras de arte em suas mãos, após trabalhado transformavam-se em laços, rabo de tatu (espécie de chicote), mas sua maior criação eram as belíssimas redes de couro, podendo ser de couro cru ou curtido artesanalmente com casca de angico, árvore típica do Pantanal.

No Pantanal, os peões utilizam couro para fazer seu material de uso diário. Tiram o couro do boi, limpam, curtem e cortam as tiras, amolecendo-as e traçando-as para confeccionarem rede, laço, rédeas, freio, badana, maneador, que substitui a corda para pear boi quando bravo, ou amarrar outras coisa necessárias na lida diária. O couro também é usado para confeccionar instrumentos de percussão, como pandeiro e o mocho (tambor) do Siriri, feitos pelos próprios executantes (SIGRIST, 2000, p. 82).

As redes de couro que Cândido habilidosamente criava, ainda podem ser vistas em apresentações culturais, embelezando o cenário e aqui em Aquidauana, você facilmente verá em apresentações da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), pois quando era vivo e gozava de suas habilidades de artesão Cândido vendeu redes sob encomendas para acadêmicos e professores, isso sem falar nos turistas que o procuravam.

Pai amoroso, jamais desamparou a família, costumava dizer que era o “esteio da casa” e mesmo com sua simplicidade plantou valores aos filhos netos, bisnetos e tataranetos, que permanecem firmes com estes valores até os dias atuais. Alguns de seus muitos filhos, advindos de dois casamentos (do primeiro casamento era viúvo, com o segundo deixou esposa e três filhos), não eram filhos biológicos, contudo não aceitava quem dissesse o contrário. Amava a todos sem distinção e encorajava-os a enfrentarem as barreiras que a vida impõe honestamente. Trouxemos a história de um homem pantaneiro para ressaltar as características do homem simples, porém respeitado pelo caráter humilde e criador. Para Ribeiro (1984), é notável o espirito inventivo do homem rural:

 

Não posso dizer que o nosso caboclo copiou o engenho de pau do homem da indústria, sou mais propenso a crer que foi o industrial que copiou o caboclo, isto sim. Um homem capaz de criar e se reinventar com o passar dos anos, utilizando a natureza a seu favor (Ribeiro, p.34,1984).

 

Cândido Ferreira, homem de cultura e de saberes, pertencente a uma geração mais antiga de pantaneiros, conheceu como poucos a história de sua gente. Para Barros (1987) “…pantaneiro sou, posso dizer há mais de cem anos. Deitam raízes nestes campos e cerrados todas as fibras do meu coração, tirando do solo verde a força do meu entusiasmo e toda a realidade de minhas convicções”. Assim, o pantaneiro partiu em 21 de maio de 2007, vítima de um derrame cerebral, deixando na lembrança o exemplo humilde dos mais antigos pantaneiros, sua vida ficou gravada nos livros da história.

 

 Encaminhamentos metodológicos: ações do PIBID tendo como figura o homem pantaneiro

 

Diante da vasta contribuição que a cultura pantaneira oferece valemo-nos da ação/reflexão/ação respaldados pelas leituras de autores como: Sigrist, (2000), Nogueira (2002), Ribeiro (1984), entre outros. Caminhamos sob a coordenação acadêmica da Professora Dra. Ana Lúcia Gomes da Silva e dos Supervisores Professora Denair Ottoboni Maciel de Castro e Professor Orestes Toledo Junior.

Apresentamos imagens para as crianças e, exploramos a releitura em suas ricas particularidades. O pantaneiro é hoje uma figura um pouco diferenciada do pantaneiro de antigamente, isso se deu em decorrência dos avanços tecnológicos que vem acontecendo de geração em geração. Sua vestimenta, por exemplo, cultiva características do passado com algumas modificações. Chapéu de palha do carandá (palmeira símbolo do Pantanal, seus troncos e folhas também são utilizados para construções de moradia ou abrigo para animais), camisa de manga comprida, calça jeans ou de outro tecido e, para proteger de espinhos entre outros, a calça de couro ou tirado (uma espécie de saia de couro com a mesma função da calça, permitindo maior movimento na lida do peão). Segundo Berteli (1984), nada é mais característico ao homem pantaneiro que o seu tirado, peça feita geralmente com couro de anta ou veado que devido a proibição da caça esta deixando de ser utilizado, mas continua sendo a marca registrada do peão. Nos pés a bota ou botina seguida pela espora, na cintura um cinto de couro com alguns bolsinhos ao qual chamam de guaiacas), bainha, faca (de lado ou nas costas).

Outrora, abordamos também a questão dos Mitos e Lendas, característicos até os dias atuais, povoando o imaginário dos habitantes do Pantanal. O homem pantaneiro, em sua simplicidade, acredita na lenda do Mar de Xaraés, que explica ser a grande área inundada do pantanal, um antigo mar que foi secando e sobraram apenas as áreas inundadas, inclusive com inúmeras baías de água salgada. Acredita ainda que o Arco-íris transporta, para outros lugares, os peixes e as baías (SIGRIST, 2000, p. 88). Ora visto como crendices, os mitos sobrenaturais transmitidos de geração em geração ajudam manter vivo na memória de  adultos e crianças, quanto aos perigos que o lugar oferece.

Dos inúmeros causos conhecidos nos pantanais, cerrados e campos, destaca-se um personagem da região de fronteira com o Paraguai, alvo de histórias fantasiosas. Trata-se de “Sinhozinho”, um frei que andou pregando ensinamentos religiosos pela região nos anos 30. Pequenino, mudo, benzia, curava e se comunicava, mesmo sem dispor de voz. Desapareceu sem deixar vestígios, mas sua presença ficou marcada pelas obras que fez, pelas cruzes e capela que construiu (SIGRIST, 2000, p. 91).

Grande perigo espreita as matas pantaneira, dentre outros, destaca-se a mais conhecida, sendo o maior felino da América a Onça urra e reina absoluta. Vivendo basicamente da carne de outros animais como: capivaras, bezerros dos bovinos ela também come o temido jacaré e, quando ameaçada, ataca também o homem. A flora pantaneira, representada pelos frondosos Ipês, foram a sensação das crianças em suas  releituras, produções artísticas, realizadas em grupos. Ao final as obras dos pintores mirins, foram expostas a partir da entrada da escola, embelezando os olhos de quem por ali passava.

 

Considerações finais

Deixamos registradas algumas das ações desenvolvidas pelo Programa de Iniciação à Docência (PIBID), na convicção que cada momento foi inteiro ao trabalhar com a cultura regional pantaneira.

Podemos apontar resultados, ainda parciais, que nos convidam a continuar no exercício docente prezando pela valorização e reconhecimento da nossa história na figura do pantaneiro que foi Cândido Ferreira (1915/2007), homem simples, analfabeto das letras, mas pedagogo pelas experiências da vida. Durante seus noventa anos dedicou-se a amar e respeitar o bioma pantaneiro, ressaltando as inúmeras possibilidades de aprender com o chão onde vive, as quais muitas obras já foram escritas enriquecendo a região Centro Oeste do Mato Grosso do Sul.

 

Referências

BARROS, Cássio Leite de. Pantanal Mato-grossense-Sentir para compreender. Campo Grande: Sociedade de Defesa do Pantanal (SODEPAN), 1987.

BERTELI, A. de P. O paraíso das espécies vivas; pantanal de Mato Grosso. São Paulo: Cerifa, 1984.

 

NOGUEIRA, Albana Xavier. O QUE É O Pantanal. São Paulo: Brasiliense, 1990.

________________. Pantanal: Homem e Cultura. Campo Grande: UFMS, 2002.

 

RIBEIRO, Renato Alves. Taboco 150 anos – Balaio de Recordações. Campo Grande, 1984.

 

SIGRIST, Marlei. Chão Batido: Cultura Popular de Mato Grosso do Sul. Folclore e Tradição. Campo Grande: UFMS, 2000.