LÍNGUA PORTUGUESA COMO INSTRUMENTO SOCIAL
Letras Português/Inglês – FAALC
MELO, B. M. A. [1]
SOARES, N. F. [2]
Palavras-chave: Multiletramentos; TIC’s; Instrumento Social, Paródia.
Este trabalho tem o intuito de apresentar a sequência didática intitulada: Língua Portuguesa como instrumento social, desenvolvida no ano de 2016, na Escola Estadual de Segundo Grau Lúcia Martins Coelho na cidade de Campo Grande – MS. Realizada nas aulas de Língua Portuguesa com os alunos do 1ºD matutino, esta sequência didática está atrelada ao projeto As TIC’s na escola: caminhos para formação de professores, coordenado pela profª Cleonice Candida Gomes Leite, coordenadora do projeto no Programa Institucional de Bolsa à Iniciação Docência (PIBID) na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – campus Campo Grande, curso de Letras: Habilitação em Português e Inglês. O projeto visa à relação tênue entre a educação e as novas Tecnologias de Informação e Comunicação, proporcionando aos acadêmicos a prática de ensino em Língua Portuguesa nas atividades de docência em escolas públicas, contribuindo com sua formação profissional. Para isso, a sequência didática pondera a responsabilidade social e norteia-se nos debates com temas sociais, sem infringir a ética e a democracia; utiliza o gênero textual paródia e a rede social como ferramenta exclusiva para expor os trabalhos realizados.
- INTRODUÇÃO
O “novo” sempre esteve atrelado às transformações obtidas pelo ser humano ao longo dos séculos. A roda, o papel, o grafite, o rádio, a televisão e o celular são algumas formas de avanço tecnológico. Para os nascidos no presente século, a internet já faz parte do seu cotidiano, tanto para aprendizagem como para o lazer. As novas tecnologias trazem inúmeros benefícios para o ser humano, como um facilitador em seu ambiente social: trabalho, lazer, escola. Com isso, o ensino tem se diversificado e as aulas cada vez mais produtivas, corroborando com o pensamento crítico e social do aluno, ao inserir as novas comunicações e tecnologias como novas formas de ensino (Multiletramentos), ampliando o conhecimento do aluno sem deixar de lado a sua identidade cultural, valores e seus conhecimentos linguísticos. A professora de Linguística Aplicada na UNICAMP Roxane Helena Rodrigues Rojo, em seu livro Multiletramentos na escola (2012), destacou o ensino com enfoque multicultural: “[..] trabalhar com Multiletramentos partindo das culturas de referência do alunado implica a imersão em letramentos críticos, que requerem análise, critérios, conceitos, uma metalinguagem, para chegar a propostas de produção transformada, redesenhada, que amplificam a agência por parte do alunado”. (ROJO, 2012, p. 8-9).
ROJO (2012, p. 125) enfatiza que o ensino multimodal se articula entre o mundo dos alunos e prática linguística, direcionando “múltiplas práticas de letramento (s) em várias esferas de atividades humanas”. Dessa forma, as atividades realizadas pelos alunos são ambientadas em diversos contextos, causando uma mescla de conhecimento, uma interdisciplinaridade em sala de aula. A autora ainda explica que essa multiplicidade de linguagens está evidenciada na diversidade linguística encontrada nos textos sociais – impressos ou digitais – com diferentes de modos de linguagem ou semiose (imagem, vídeo, etc.), e que exige a capacidade do aluno em compreendê-las e produzir um significado.
Tem-se o objetivo deste trabalho um ensino voltado para a responsabilidade social ao utilizar-se de textos que trabalham as diferenças sociais, atrelados aos debates sobre discriminação, racismo, bullying, homossexualismo, obesidade, etc., proporcionando aos alunos a compreensão e a busca por uma cidadania digna, livre de preconceito. Assim, como resposta, a paródia trabalha essas diferenças sociais com senso crítico e democrático, refletindo nas produções dos alunos, suas vivências e experiências ao entender o gênero textual, pontuado na criação de uma página na rede social Facebook.
- EMBASAMENTO TEÓRICO
De acordo com ROJO (2012, p. 11) o Multiletramento surgiu em 1996 com o manifesto do Grupo de Nova Londres (GNL) ao afirmar da necessidade da escola em se posicionar nos novos conceitos de letramento que surgiram dentro da sociedade, agravado pelo choque cultural causado dentro da sala de aula, devido à intolerância de uma convivência com divergências culturais. Mas como trabalhar de forma a unir diferentes culturas e seus aspectos sociais, proporcionando uma educação mais apropriada? Neste sentido, o ensino é complementado com os Multiletramentos em sala de aula: envolve as novas faces de comunicação e letramento, proporcionando uma nova linguagem entre professores e alunos.
Entretanto, se faz necessário uma percepção do professor de Língua Portuguesa, ao estar conectado com as mudanças ocorridas dentro e fora de sala de aula. Tal mudança interfere na busca do conhecimento pelo aluno, pois suas produções estarão arraigadas no seu mundo intelectual, seus conceitos e valores. Cabe ao professor ambientar seus alunos nas divergências sociais, seus prós e contras, e realizar uma educação comprometida com o social em que as diversas opiniões são parte de uma democracia constante. A professora de Metodologia em História (Univille) Dra. Nelma Baldin juntamente com a professora auxiliar na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra Dra. Cristina Albuquerque organizaram o livro Novos Desafios na Educação – Responsabilidade Social, Democracia e Sustentabilidade que tem por objetivo o debate crítico aflorado à reconstrução do saber, da educação e das práticas educacionais, fundamentando um novo paradigma humano composto por um conhecimento ético e social.
No livro, as autoras Baldin e Albuquerque (2012) evidenciam a educação como ferramenta para a cidadania, sendo capaz de sensibilizar e motivar a transformação em diversas formas de participação, ao abrir novos caminhos para uma comunidade socialmente ativa na área educacional. Baldin e Albuquerque (2012, p. 237) ressaltam que “a apropriação crítica do conhecimento, no sentido de emancipação social e da afirmação, solidária e responsável, de um projeto e de um agir coletivo, constitui-se como eixo central da construção do indivíduo como sujeito político”.
Contudo, a premissa não se trata de um engessamento na prática educacional (como ler, compreender e responder), mas em ressaltar as diferenças positivamente dentro da sala de aula, compartilhando o conhecimento de mundo dos alunos. Privilegiar o convívio diversificado e debater as intolerâncias sociais proporciona um crescimento pessoal e coletivo dos alunos. As produções culturais e artísticas (música, cinema, teatro, redes sociais) são o vínculo mais próximo entre o professor e os alunos, por estarem presentes em seu cotidiano. Cabe ao educador utilizá-las por se tratar de ferramentas interativas com os meios tecnológicos e pela facilidade com que seus alunos sabem utilizá-las.
Dessa forma, o dialogismo entre as novas comunicações e seu modo de adequação proporciona uma autonomia no aluno, aumentando o seu interesse pelas disciplinas, seu senso de responsabilidade educacional, e melhor apreensão do conteúdo curricular apresentado pelo professor.
Vivemos em um mundo em que se espera (empregadores, professores, cidadãos dirigentes) que as pessoas saibam guiar suas próprias aprendizagens na direção do possível, do necessário e do desejável, que tenham autonomia e saibam buscar como e o que aprender, que tenham flexibilidade e consigam colaborar com urbanidade. (ROJO, 2012, p. 27).
2.1 Gêneros textuais: A Paródia
Os gêneros estão inseridos no cotidiano de todos, como anúncios, artigo de jornal, receita médica, manuais, guias turísticos, etc., sobressaltando a nossa competência ao adequar os textos corretamente para ocorrer à comunicação, sendo modulados e remodelados de acordo com as interações comunicativas. Por isso, é fundamental que o educador inclua, na formação teórica de seu educando, o estudo de gêneros textuais na composição da escrita, devido a sua diversidade e importância para a área comunicativa.
Dessa forma, há uma maior possibilidade de escrita para o aluno, aumentando seu desenvolvimento ao redigir um texto e ampliando sua competência textual. A professora em Letras e livre-docente em Análise do Discurso na UNICAMP Dra. Ingedore Villaça Koch juntamente com a professora associada do departamento de português da PUC-SP Dra. Vanda Maria Elias organizaram o livro Ler e Escrever (2009) e ressaltam as teorias sobre texto e escrita, atreladas as práticas de ensino, que favorecem a compreensão e a peculiaridade de cada gênero textual. De acordo com as autoras Koch e Elias (2009, p. 56), os gêneros textuais compreendem as “[…] práticas socialmente constituídas com propósito comunicacional configuradas em texto”.
Dada à importância de ressaltar os estudos de gêneros textuais proposto pela professora Manoela nas aulas de Língua Portuguesa na turma do 1ºD da Escola Estadual de Segundo Grau Lúcia Martins Coelho, nos atemos ao gênero textual paródia na produção da sequência didática. Este gênero já foi estudado anteriormente pelos alunos, ocorrendo uma aceitação imediata. O gênero textual paródia consiste na releitura de algo existente como música, textos literários, obras de arte, imagens, etc. Segundo o Dicionário Priberam, o substantivo feminino paródia tem origem no grego, podendo significar “imitação, burlesca de uma obra séria, reprodução burlesca de qualquer coisa e animação, farra, pândega”[3]. Na maioria das vezes, estão atrelados ao cômico e ao drama, recursos utilizados para dar ênfase ao deboche e à ironia.
O gênero textual paródia utilizado na aplicação da sequência didática deu-se através de textos, música e imagens, ou seja, sendo composto por diversos tipos de linguagens e suas implicações em compreender cada uma delas como texto verbal ou imagético. Esta compreensão corrobora com a construção de significados e suas possíveis releituras ao produzir novos textos.
- METODOLOGIA
As formas de se interagir com outras pessoas estão mais amplas, devido ao crescimento das plataformas de comunicação encontradas nas redes sociais. Conectadas com um ou mais aplicativos de relacionamento, a ligação social não se restringe à distância física, mas ao limite de confiança e expectativa no outro, em ser real ao compartilhar informações, interesses e características pessoais. Facilmente, encontram-se pessoas frustradas com o mundo virtual: nem sempre o que se vê é uma realidade promissora. Porém, as redes sociais servem como um percursor de ideias ativistas, encontros amorosos, denunciador de acontecimentos inoportunos e a atual moda da viralização[4]: espalha ideias de cunho social ao incitar publicamente campanhas com responsabilidade social, inspirando pessoas do mundo inteiro a compartilhar sempre a mesma hashtag[5].
A falta de limites de alguns usuários tem gerado constantes infortúnios no ciberespaço. Por ser uma ferramenta de comunicação rápida, pessoas de péssima índole utiliza da internet para propagar informações fraudulentas e que, muitas vezes, por não ter uma orientação a respeito, o adolescente fica exposto a situações delicadas. Boatos, acusações e mentiras são alguns casos em que se nota uma alteração no comportamento do adolescente. Uns chegam a sofrer bullying e preconceito dentro da sua rede social, o que leva a atitudes extremas como o suicídio. Cabe aos pais, professores e a escola disseminarem ideias construtivas, orientando os adolescentes sobre os riscos de se cometer ou de sofrer tais atitudes na internet.
Através do gênero textual paródia, buscou-se inserir textos, músicas e imagens a fim de retratar temas sociais como Bullying, Obesidade, Racismo e Homossexualidade incentivando o senso crítico do aluno ao entrar em contato com os diversos tipos discriminações sociais, fazendo-os expressar seus sentimentos, opiniões e concepções sobre esses assuntos polêmicos e reproduzir suas experiências em seus textos.
Iniciou-se a sequência didática com a observação do comportamento dos alunos do 1ºD e escolhemos a plataforma Facebook por ser uma ferramenta de fácil utilização e que atende os formatos midiáticos como textos, imagens, sons e vídeos. Os encontros ocorreram na Escola Estadual de Segundo Grau Lúcia Martins Coelho na cidade de Campo Grande – MS, no período matutino, nos dias 16, 23 e 30 do mês de Outubro de 2017, sendo planejada para alunos do Ensino Médio. No primeiro contato, ouve a explanação das ideias apresentadas na sequência didática e a elaboração de um debate sobre discriminação. Esse debate teve como objetivo conhecer os alunos e saber o que eles pensam a respeito desses temas, suas ideias, opiniões, os tipos de conhecimento de mundo que eles carregam em sua formação intelectual e religiosa. Apresentamos 4 textos de opinião[6] e 1 vídeo[7] disponíveis na internet, que foram interpretados pela turma, expondo seu ponto de vista de forma democrática e organizada.
Os textos de opinião retratam a discriminação e suas vertentes, pontuam os perigos e a ênfase em propagar a inclusão social. Num dado momento, trabalhamos com a elaboração de cartazes contribuindo com a organização das ideias e como resposta obtida por meio dos debates. Os alunos escolheram as imagens e as frases, de acordo com o tema e a intenção de seu texto. No último momento da sequência didática, os alunos produziram uma página no Facebook, tornando visível para sua comunidade escolar e amigos, as reflexões obtidas e o impacto social que elas causam no meio em que vivem.
- RESULTADOS OBTIDOS
A sequência didática foi pensada e repassada com o intuito de promover o debate democrático, o livre pensamento e a disseminação de boas ideias entre os estudantes de ensino médio. Ao expor suas ideias, opiniões e, até mesmo seus questionamentos, surge o pensamento crítico e o senso de justiça ao querer viver em um mundo livre de preconceito. Cada aluno trouxe para si a responsabilidade social como cidadão e a importância da inclusão social, interagindo nas redes sociais de forma adequada e realista, sem palavras de ofensas ou desmoralizadoras.
Acreditamos que este debate está incentivando uma nova forma de ver o outro, não podendo parar nas quatro paredes da sala escolar, por impulsionar uma consciência atrelada ao juízo de valor nos alunos frente mudanças sociais, diferenciando as suas publicações nos aplicativos de interações sociais.
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
O desenvolvimento desta sequência didática ressaltou a importância em promover o debate social junto com os adolescentes, ouvi-los e compreendê-los, pois externam suas dificuldades vividas, mesmo sendo tão jovens. Estes são alunos de ensino médio que estudam em escola pública, de período integral e mesmo nessas condições, não encontramos barreiras para progredir junto com eles; nossos encontros foram marcados pela descontração que carregam. Percebemos que a inserção das Tecnologias de Informação e Comunicação em sala de aula se faz necessária para ampliar o conhecimento do aluno, diversificando a aula (já não é monótona, como eles mesmo disseram) e introduz o professor de Língua Portuguesa no ambiente em que os alunos são nativos digitais. Compreendemos o quanto é importante em divulgar os cartazes na página do Facebook criada por eles, por ter cunho social e responsabilidade na comunidade educacional. Os resultados foram satisfatórios, os alunos participaram de tudo o que foi proposto, manifestando o pensamento crítico e consciente nas redes sociais.
REFERÊNCIAS
BALDIN, N; ALBUQUERQUE, C. (Org.). Novos desafios na educação: responsabilidade social, democracia e sustentabilidade. Brasília: Líber Livro, 2012.
KOCH. I. V. ELIAS, M. V. (Org). Ler e escrever: estratégias de produção textual. 2ª ed, 4ª impressão. São Paulo: Contexto, 2017.
ROJO, R; MOURA, E. (Org.). Multiletramentos na Escola. São Paulo: Parábola editorial, 2012.
SM, Edições. Ser protagonista: Língua Portuguesa, 1º e 3º anos: Ensino Médio. 2 ª ed. São Paulo, 2013.
[1] Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência do Curso de Letras – habilitação português/espanhol da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
[2] Bolsista do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência do Curso de Letras – habilitação português/espanhol da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
[3] Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, 2008-2013, < https://www.priberam.pt/dlpo/par%C3%B3dia>, acesso em 19/10/2017.
[4] “Viralização é um termo que surgiu com o crescimento do número de usuários das redes sociais e blogs. A palavra é utilizada para designar os conteúdos que acabam ganhando repercussão (muitas vezes inesperada) na web. ” Blog Pense Avanti! 2014, < http://blog.penseavanti.com.br/entenda-melhor-o-termo-viralizacao-por-que-um-conteudo-se-torna-viral/>, acesso em 19/10/2017.
[5] Significado de Hashtag: “Recurso de agrupamento que identifica grupos ou conteúdo específicos em alguns sites, através do símbolo “#”, antes de uma palavra ou expressão, com o objetivo de facilitar a pesquisa pelo assunto com o qual esse símbolo se relaciona: algumas hashtags espalham boas ideias pelas redes sociais”. Dicio – Dicionário online de Português, 2009-2017, <https://www.dicio.com.br/hashtag/>, acesso em 19/10/2017.
[6]VARGAS, C. S. I. Discriminação. Disponível em: <http://meuartigo.brasilescola.uol.com.br/sociologia/discriminacao.htm>, acesso em 30/09/2017.
SILVA, C. F. Programa de reflexões e debates para a Consciência Negra. Disponível em: <http://revistapontocom.org.br/materias/estudante-e-premiado-por-texto-sobre-racismo>, acesso em 29/09/2017.
GABRIEL. Da legislação interna pertinente ao assunto. In: Conhecendo o seu espaço. Disponível em: < http://historia-802.blogspot.com.br/2011/09/constituicao-de-1988-o-que-fala-sobre_22.html>, acesso em: 29/09/2017.
SIMÕES, F. MARQUES, C. HENRIQUES, M. O Racismo. In: Poemas sobre o racismo. Disponível em: <http://becastanheiradepera.blogs.sapo.pt/textos-sobre-o-racismo-89702>, acesso em: 23/09/2917.
PINTEREST. Disponível em: <https://www.pinterest.pt/explore/frases-contra-la-homofobia/?lp=true>. Acesso em 23/09/2017.
[7]SOU GORDINHA MESMO! PARÓDIA (Aquele 1%). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=D2OYymKu-M0> acesso em: acesso em: 23/09/2017.