PRÁTICAS DE DOCÊNCIA PARA O ENSINO DE CIÊNCIAS E ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA NO 5º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
SEVERO, A.M.N.; ARAUJO, C.B.Z.
Palavras-chave: Pibid. Ensino de ciências. Alfabetização científica.
1 INTRODUÇÃO
O panorama escolar brasileiro contou historicamente com a marcante presença da abordagem pedagógica tradicional na prática docente de professores da educação básica. No âmbito do ensino de ciências essa influência redundou num processo de comunicação de verdades científicas, não existindo possibilidade de discussões sobre os dissensos e os posicionamentos ideológicos existentes no processo de produção científica. Krasilchic (2000, p.87) observa que: “[…]. A tendência de currículos tradicionalistas ou racionalistas acadêmicos, apesar de todas as mudanças, ainda prevalecem não só no Brasil, mas também nos sistemas educacionais de países em vários níveis de desenvolvimento.[…].
Krasilchic (2000), ao fazer o balanço das orientações curriculares nos anos 2000, salientou uma série de mudanças propostas para o ensino de ciências, decorrentes das transformações sociais, políticas e econômicas nas últimas décadas. A autora pontuou a organização comportamentalista nos anos 1960, que impactou essencialmente o planejamento; a penetração das ideias de Jean Piaget, no final dos anos 1960, trazendo a perspectiva construtivista, mas com práticas descoladas das concepções epistemológicas defendidas pelo autor; nos anos 1980, menciona a presença da perspectiva do ensino de ciências associado ao desenvolvimento da responsabilidade social, cidadania e sustentabilidade e nos anos 1990, destaca o Movimento “Ciência para todos”. Sobre a implantação dos Parâmetros Curriculares Nacionais a autora comenta:
[…] Pela demanda de justiça social nos atuais parâmetros curriculares, muitas das temáticas vinculadas no ensino de Ciências são hoje consideradas “temas transversais”: educação ambiental, saúde, educação sexual. No entanto, a tradição escolar ainda determina que a responsabilidade do seu ensino recaia basicamente nas disciplinas científicas, principalmente a Biologia.A reforma brasileira reforça um movimento equivalente ao da “Ciência para todos”, sem, no entanto, incluir cuidados para que excessos nessa postura tornem o currículo pouco rigoroso, em nome da necessidade que se tornou um estribilho nas publicações e avaliações oficiais de desenvolver “competências e habilidades”.
O risco grave é de que se percam de vista os objetivos maiores do ensino de Ciências, que deve incluir a aquisição do conhecimento científico por uma população que compreenda e valorize a Ciência como empreendimento social. Os alunos não serão adequadamente formados se não correlacionarem as disciplinas escolares com a atividade científica e tecnológica e os problemas sociais contemporâneos.[…]. (KRASILCHIC, 2000, p. 89-90).
No Programa Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid) defende-se a perspectiva da importância da articulação entre alfabetização e letramento e entre teoria e prática, de modo a propiciar o aprendizado do aluno de forma crítica e prazerosa, através do desenvolvimento de aulas mais versáteis e que fujam dos padrões conservadores e da transmissão do conteúdo apenas de forma expositiva. No subprojeto do Pibid/Ufms do Curso de Pedagogia/EaD/São Gabriel do Oeste, os objetivos são os de estimular a reflexão sobre as possibilidades de proposta práticas e experimentais para o ensino de ciências, apresentados como alternativa para superação das fragilidades destacadas, e para alcançar os objetivos do ensino de ciências no processo de iniciação à alfabetização científica.
Sobre a alfabetização científica, Krasilchik e Marandino (2007, p. 31) afirmam:
A escola possui papel fundamental para instrumentalizar os indivíduos sobre os conhecimentos científicos básicos. No entanto, nem ela nem nenhuma instituição têm condições de proporcionar e acompanhar a evolução de todas as informações científicas necessárias para a compreensão do mundo. A ação conjunta de diferentes atores sociais e instituições promove a alfabetização científica na sociedade, reforçando-a e colaborando com a escola.
Através das ações realizadas pelos órgãos relacionados ao estudo de ciências como o Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura (IBECC), a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento do Ensino de Ciências (FUNBEC), os Centros de Ciências e Programa de Expansão e Melhoria do Ensino (PREMEN), foi possível desenvolver a constituição de uma geração de educadores atentos com o ensino das ciências no Brasil, composta por pessoas que conviveram com os diversos momentos e que, pensando criticamente passam a refletir novos rumos para o ensino de ciências. Buscando a melhoria no processo de produção de material didático, e para concluir uma significativa alteração na dinâmica em sala de aula, propondo um destaque do “ensino experimental” e melhoria na formação do professor e sua capacitação continua.
A história do ensino de Ciências, a produção científica na área e a realidade atual devem convergir e instrumentalizar os professores de diferentes níveis de ensino. Algumas dessas formas dizem respeito ao conjunto geral em que acontece o ensino e dependem de ações de políticas governamentais e outras ações que estão relacionadas ao trabalho do professor em sala de aula.
Neste resumo é exposto o relato de experiência de uma graduanda do curso de Pedagogia, vinculada ao Pibid, desenvolvido no quadrimestre de junho a setembro de 2017.
2 PRÁTICAS DOCENTES NO ENSINO DE CIÊNCIAS COMO EXPERIÊNCIA DO PIBID
A intervenção pedagógica foi desenvolvida na cidade de São Gabriel do Oeste localizada na região norte do estado do Mato Grosso do Sul, conhecida por sua produção agropecuária. O município é um dos mais ricos e produtivos do Estado de Mato Grosso do sul. (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2017).
A escola parceira do Pibid, para o subprojeto de Pedagogia é a Escola Municipal Nilma Gloria Gerace Gazineu, localizada na região norte da cidade no Bairro do Jardim Gramado, região mais populosa e de classe média baixa da cidade. No entorno da escola situam-se pequenos comércios e residências de estruturas simples. Os alunos são, predominantemente, do próprio bairro ou de bairros próximos como Fênix e São Cristovão, ambos que também contam com uma população numerosa menos favorecidos, o bairro possui unidade básica de saúde, praça e um ginásio de esportes que atendem os alunos em período de contraturno com alguns miniprojetos como futebol e judô.
É uma região muito conhecida pela violência e ações de pequenos furtos, por isso os professores que trabalham na escola têm algum receio no início em serem escalados para executar seu trabalho nesta escola, uma realidade que vem mudando com o passar dos tempos, pois as gestões públicas vêm buscando investir constantemente em segurança na região, proporcionando mais tranquilidade, tanto para professores e funcionários como até mesmo para os próprios estudantes.
A rede municipal de ensino de São Gabriel do Oeste, MS, vem utilizando há alguns anos material apostilado produzido pela UNINTER[1], incluindo o ensino de ciências. O sistema apostilado é alvo de debates constantes, pois alguns acreditam que favorece a uniformização do ensino municipal, gerando maior igualdade e democratização, enquanto outros ressaltam o engessamento metodológico das práticas pedagógicas gerado com a implantação de tal sistema, restringindo a busca dos professores por novas propostas e práticas de ensino em diversas disciplinas e também no ensino de ciências.
A implantação deste material apostilado, além de gerar este debate, causou uma repercussão entre os professores da escola Nilma G.G. Gazineu de como deveriam ser os procedimentos de implantação da apostila, em vista do curto período de aulas que possuem em sala com os alunos e o extenso conteúdo proposto na apostila, muitas vezes não sendo viável a execução de experiências previstas na apostila. Esta discussão ainda está em desenvolvimento e os professores têm buscado se adequar e utilizar a apostila como um direcionador, norteador na aplicação do conteúdo de ciências, desenvolvendo algumas experiências presentes na apostila e outras abordadas por eles.
Através das observações realizadas na sala do 5º ano A, contato direto com o material pedagógico e com a professora de ciências, pude perceber que a mesma adota a apostila como base praticamente única de organização do trabalho didático, e que, muitas vezes, por conta do extenso conteúdo e a turma ser muito numerosa, acaba não desenvolvendo atividades práticas que extrapolem o espaço da sala de aula, como a quadra de esportes e os laboratórios de informática e sala de vídeo.
As lacunas observadas serviram de guia para a estruturação da intervenção pedagógica desenvolvida nesta turma. Foram realizadas atividades diversificadas buscando atrelar o conhecimento do conteúdo, com vivências práticas do mesmo. A aceitação dos alunos foi bem grande e pude perceber claramente através de relato dos mesmos que esta não era uma prática comum oferecida pela professora. As práticas desenvolvidas minimizaram, inclusive, a indisciplina da turma.
Através das observações realizadas na sala do 5º ano A, contato direto com o material pedagógico e com a professora de ciências, pude perceber que a mesma adota a apostila como base praticamente única de organização do trabalho didático, e que, muitas vezes, por conta do extenso conteúdo e a turma ser muito numerosa, acaba não desenvolvendo atividades práticas que extrapolem o espaço da sala de aula, como a quadra de esportes e os laboratórios de informática e sala de vídeo.
As lacunas observadas serviram de guia para a estruturação da intervenção pedagógica desenvolvida nesta turma. Foram realizadas atividades diversificadas buscando atrelar o conhecimento do conteúdo, com vivências práticas do mesmo. A aceitação dos alunos foi bem grande e pude perceber claramente através de relato dos mesmos que esta não era uma prática comum oferecida pela professora. As práticas desenvolvidas minimizaram, inclusive, a indisciplina da turma.
Durante o período de quatro dias, desenvolvi atividades na disciplina de ciências bem dinâmicas e diferenciadas do cotidiano que os alunos estavam acostumados, tirando-os um pouco de sua zona de conforto, mas mantendo o conteúdo a ser desenvolvido naquele período, apenas implantando algumas estratégias didático-pedagógicas diferenciadas, para desafiá-los a pensarem além dos padrões pré-estabelecidos, e estimulá-los a pensamentos críticos e desafiadores, através de aulas mais práticas e dinâmicas.
Ministrei aulas durante quatro dias na escola Nilma Gloria Gerace Gazineu na turma do 5º A que, segundo relatos da professora e da coordenação da escola, é uma turma bastante agitada e bem numerosa, contendo 36 alunos com diferentes particularidades sociais, são alunos de classe média baixa. A escola vem passando por grandes mudanças, entre restaurações e reformas, para melhor atender aos alunos, mas que também geram agitações nas turmas.
Abordei o conteúdo do sistema locomotor, composto pelos sistemas muscular e sistema esquelético e optei, no primeiro dia, por desenvolver o conteúdo de maneira a envolver os alunos em práticas como uma aula de queimada, na quadra da escola. Após efetuar o levantamento de conhecimentos prévios que eles tinham sobre o assunto, solicitei que fizessem observação prática das partes do corpo humano que são utilizadas no sistema locomotor.
No segundo dia levei os alunos ao laboratório de informática para desenvolverem atividades relacionadas ao conteúdo, com uso de softwares e jogos livres.
No terceiro dia foi desenvolvida a atividade da apostila a qual eles estão acostumados, e é exigido pela escola, pois ocorre uma cobrança do município e dos pais. Porém, para diversificar levei vídeos bem interessantes do conteúdo, a partir dos quais os alunos puderam visualizar o corpo humano em imagens 3D.
No quarto e último dia, entreguei uma atividade bem interessante de um esqueleto articulado, que requeria a pintura das partes pelos alunos e depois a montagem do mesmo no caderno. Estas atividades práticas junto com a explicação dos conceitos dos sistemas esquelético e muscular, que formam o sistema locomotor, foram melhor compreendidas pelos alunos através das atividades práticas.
Através da experiência em sala de aula, foi possível observar os grandes desafios enfrentados pelo docente que atua na área de ciência com os impasses impostos pelos materiais ofertados pelo município; toda a cobrança que existe acerca de sua utilização; a dificuldade de se trabalhar experimentação em turmas numerosas e com alunos muitas vezes indisciplinados ou até mesmo desinteressados.
É muito importante compreendermos que o estudo de ciências está correlacionado com as relações com a sociedade e o meio que a cerca, e é de vital relevância para o indivíduo compreender o mundo em que vive e suas características. Apenas a formação crítica do cidadão atrelada à alfabetização científica proporcionará a construção de conhecimentos sobre a ciência necessários ao momento atual.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No decorrer das ações desenvolvidas no âmbito do Pibid, pude perceber que o ensino de ciências vem sofrendo grandes alterações ao longo dos anos, sustentadas por diferentes percepções de ciência, mas, nos últimos anos, com olhar não apenas para o conteúdo, mas sobre as relações didático-pedagógicas, a responsabilidade social e as condições concretas de vida. Ou seja, não basta recitar conteúdos, é preciso usar o conhecimento para entender a vida no âmbito biológico e social.
Essa abordagem permite que os estudantes, mediados pelos professores, sejam capazes de um pensamento cientifico mais crítico. As proposições pedagógicas que estimulam a ação ativa dos estudantes como o desenvolvimento de projetos, ações investigativas, ações interdisciplinares, favorecem esse processo.
Para gerar a mudança efetiva nas práticas dos professores, eles necessitam do auxílio do poder público, por meio do desenvolvimento de políticas para formação continuada, que não estejam centradas em receitas metodológicas, mas que possam abranger a organização do trabalho docente a partir de uma reflexão ampla sobre a organização da sociedade, as concepções de ensino e de aprendizagem, coerentes com a organização dos processos metodológicos. Também cabe ao professor buscar formas diversificadas de expandir seus conhecimentos e transformar sua prática docente.
A intervenção pedagógica desenvolvida demostrou a possibilidade concreta da realização de atividades reflexivas, investigativas e de demonstração, combinada ao uso do material apostilado.
REFERÊNCIAS
FROTA-PESSOA, O. Etapas da implantação dos cursos renovados. Ciência e Cultura, Campinas, SP, v. 16, n. 4, p. 363-367, 1964.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. IBGE Cidades. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?lang=&codmun=500769&search=mato-grosso-do-sul|sao-gabriel-do-oeste>. Acesso em: 26 de jun. 2017.
KRASILCHIK, M. Reformas e realidade: o caso do ensino das ciências. São Paulo em perspectiva, v.14, n.1. p. 85-93, 2000.
KRASILCHIK, M.; MARANDINO, M. Ensino de ciências e cidadania. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2007.
[1] Empresa privada sediada em Curitiba, PR, que oferta Cursos de Graduação e Pós-graduação e formação continuada, além de material didático.